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Um Ato de Resistência

Data: 06/07/2016

Dr. Tércio Kasten - presidente da Confederação Nacional de Saúde

 

No discurso feito em Ottawa, em 1941, na busca de aliança com os americanos após uma resistência histórica de 3 anos à máquina de guerra alemã, Winston Churchill revelou: “quando eu falei ao Reino Unido que lutaríamos sozinhos, se necessário, os generais disseram ao Primeiro-Ministro que em três meses a Inglaterra estaria com o pescoço torcido como uma galinha. Que galinha! Que pescoço!”.

 

Também no Brasil pode-se sempre contar com profetas da derrota aconselhando autoridades do governo à desistência do combate. “O tamanho do SUS precisa ser revisto”, sussurraram no ouvido do Ministro da Saúde. “O Estado não pode assumir as garantias de universalidade, gratuidade e integralidade”.

 

O presidente interino Michel Temer, em uma postura estadista, calou estas vozes, e anunciou um estudo para repactuar a divisão de recursos entre os diversos entes federativos, assumindo que a única solução real para a saúde brasileira é a expansão do SUS e o fortalecimento das fontes públicas de financiamento do sistema.

 

A Confederação Nacional de Saúde (CNS) está na trincheira de resistência em defesa do SUS há 20 anos! A CNS representa 270 mil estabelecimentos prestadores de serviços à saúde, privados com ou sem fins lucrativos. Quando a Tabela de Procedimentos médico-hospitalares do SUS foi congelada, há duas décadas, e os repasses do governo para atendimentos pelo SUS passaram a não cobrir sequer os custos de receber os pacientes, nossos gestores não fecharam as portas dos hospitais.

 

Pois os hospitais privados e filantrópicos estão no front de batalha, não nos gabinetes. Em alguns estados, respondemos por até 70% de todos os atendimentos pelo SUS. Nossas equipes não mandam cidadãos doentes ou em perigo de vida de volta para casa. Nós prestamos os serviços de saúde necessários, e pagamos a conta. Do nosso bolso.

 

Hospitais, clínicas e laboratórios, associados à CNS estão, desde o começo deste milênio, financiando o SUS. Cada internação, cada material usado, cada procedimento médico executado em benefício de um paciente recebido pelo SUS gera um déficit operacional. Nos pequenos hospitais capilarizados no território nacional, próximos das comunidades, essa conta varia em torno de R$ 500 mil ao ano.

 

Alguns de nossos administradores hospitalares já receberam os mais conceituados certificados de excelência em gestão. Seguimos rigorosos protocolos internacionais de eficiência – e continuamos operando em déficit, porque o subfinanciamento crônico da saúde pública impõe ao gestor hospitalar a convivência diária com esta decisão moral: salvar a vida ou deixá-la morrer, curar ou se omitir.

 

Porém, a CNS compartilha com a sociedade o grave alerta que temos recebido de nossos administradores de hospitais: as dívidas se acumularam ao ponto do insustentável, os juros impostos ao setor de saúde são irresponsáveis, e há o perigo real e imediato de um iminente colapso no Sistema Único de Saúde. Este colapso se manifesta na incapacidade dos estabelecimentos privados e filantrópicos de continuar a prestar serviços de saúde àquela parcela da população cuja vida e saúde dependem exclusivamente do SUS – cerca de 150 milhões de compatriotas.

 

A CNS já entregou ao presidente Michel Temer, e ao ministro da Saúde, Ricardo Barros, um estudo minucioso, detalhado, com propostas viáveis nas esferas técnica, política, financeira e social para revigorar o setor da saúde. Sabemos que os governos se preocupam com os custos de fazer alguma coisa. Também devem conhecer e se preocupar com os custos de não fazer nada.

 

Neste mês de julho, celebramos o Dia do Hospital – dia 2 – e logo após o Dia do Administrador Hospitalar – dia 14. “Não há o que celebrar”, reclamam os críticos do sistema de saúde que não postulam ações propositivas. Há, sim, nós afirmamos.

 

Não faltam hospitais no Brasil, embora falte custeio daqueles que estão abertos. Não falta eficiência, embora faltem recursos. Não falta capacidade de gerenciamento de crise, embora a crise se aproxime da catástrofe. Em tudo estamos instruídos, como disse São Paulo Apóstolo. E esperamos por uma política nacional de saúde que não se omita ou desvirtue no mero cumprimento burocrático dos orçamentos, mas se comprometa com a vida.

 

Dos gestores hospitalares associados à CNS, corajosamente entricheirados na resistência, combatendo o bom combate, recebemos esta valiosa esperança: de que liderar pelo exemplo não é uma das maneiras de liderar. É a única.

 

Fonte: JORNAL BRASILIA AGORA / CNS

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